quarta-feira, 24 de junho de 2015

Para meu pai, com amor

Um dia, eu tive um sonho.
Sonhei com um Deus que não me fizesse sentir a dor da perda.
Mas o Deus que eu conheço, vez ou outra vem e me tira um pouquinho...
Pra me lembrar que não perder, é só uma ilusão bonita.
E cada ano que passa, eu respiro fundo e meu coração se enche de alívio.
Ele tá aqui. Ele ainda tá aqui.
Queria poder tirar isso do coração e ir mostrar ali no quarto ao lado,
O alento que sinto ao saber que ele ainda tá ali pra mim.
Essa data em específico,faz meu coração bater mais devagar.
Mais um ano eu vou poder abraça-lo. Mais um ano que ele tá ali,tão perto.
Queria ser melhor com essas coisas.
Queria ser mais expressiva.
Queria chegar naquele quarto e abraça-lo até sufoca-lo.
E dizer que eu o amo tanto e que o meu maior medo é perde-lo.
-Fica mais pai...fica mais trezentos anos!
Mas todo ano é igual.
Chego ali de manhã e desejo feliz aniversário e muitos anos de vida.
E vou embora viver.
Mas entenda, pai.
Que por mais clichê que isso seja...
Você vivendo ao meu lado, por muitos e muitos anos... é a minha mais bela ilusão.
E que assim seja, pro resto da minha vida.
Te amo mais do que a mim mesma.
Obrigada por permanecer.

Oração


Peço que seja paciente
E não, não posso te afirmar por qual direção caminho,
Se estou no meio de, 
Se estou prestes a,
Se sequer eu botei meus pés em algum caminho.
Peço que me perdoe
Caso eu demore a chegar,
Caso eu erre outra vez o percurso,
Caso eu me perca e não alcance.
Não deixei de acreditar em todos os propósitos. O caso é que , me parece pelo menos, que eu ainda não tenha compreendido ...esse meu.
Não, hoje não te peço nada. Só essa dose de paciência e de perdão. Talvez um pouquinho só de compreensão.
Talvez desabafo, porque nem todo dia é fácil acordar e ir dormir sem esse alento de qualquer convicção.
Eu tenho pressa ,
Não sei pra onde,
Não sei por que.
Nem por quem.
Eu tenho pressa e isso me corrói.
E só peço que ainda assim,
me aceite.

Na noite que existe

Naquela noite, não tive vontade de te ver.
Na verdade nem chegava a ser pessoal. Não queria você nem ninguém. 
Sinceramente, se eu pudesse, eu deixaria de existir naquela noite.
Não tem nada a ver com morte esse lance de deixar de existir. Talvez tenha mais algo a ver com libertação.
De mim
De você
E de quem quer que fosse.
Sim, seria um belo desejo pra aquela noite.
Esse deixar de ser.
Digo sobre aquela noite, porque desconfio que aquela noite não foi feita de coisa alguma, e é exatamente essa coisa alguma que me esvaziou ao ponto de não querer ver e existir.
Tenho pânico de noites vazias como aquela.
Não me recordo qual foi a ultima antes daquela, mas desconfio que já ocupei sim essa outra noite em algum momento da minha vida.
Algum momento vazio.
E esse pânico me arrasta pra onde nunca gosto de ir, que é exatamente esses espaços dentro da gente que sofrem , esses espaços que deixam de sonhar. Me sinto menor depois de ocupar esses lugares obscuros meus.
E a única coisa que eu penso é que eu ainda não devo me afogar. Nessas horas que, quase sem força eu preciso ainda buscar por esses outros lugares feitos de luz.
Porque eu preciso resgatar ainda essa vontade de ver,
Você
o mundo .
E de existir
Pra outras noites.

Imensos prazeres de um instante



E finalmente, ela se sentiu incrível.
Digo finalmente, porque não é esse o sentimento que ela nutre por si mesma a maior parte dp tempo.
Ela costuma ter pena de si mesma. Das suas curvas, dos seus diplomas, da sua mesmice, da sua rotina. 
E desse cabelo, que ela não compreende e nem aceita. Esse cabelo que dá dó.
Mas, nesse exato momento, ela se sente incrível, como se tivesse alcançado o apogeu das coisas,
Dessa “vidinha “
Hoje ela se levantou tarde, só escovou os dentes depois da segunda vez que comeu.
Não se importou com os cabelos. Ajeitou-os num coque mal feito, não pra se sentir melhor em relação a eles, mas pra tirá-los da frente do seu sorriso.
E sim, fez as duas refeições completamente nua. Fazia calor , e esse desejo de se sentir satisfeita fez com que ela precisasse estar nua enquanto dispensava a salada por um prato de lasanha e outro de sorvete com calda.
Tomou um banho e depois não secou os cabelos, nem se conferiu no espelho.
Entrou em um camiseta velha
E se derramou dentro de um sofá.
Abriu uma cerveja gelada, acendeu um cigarro.
E fim.

quarta-feira, 17 de junho de 2015

O que me habita

Eu lido com as minhas misérias todos os dias. Com a minha imundície, que nem sequer cabe mais nesse quarto.
Varro pra debaixo dos tapetes. Tantos tapetes , tanta coisa gasta, surrada e velha que me habita.
Queria compor uma canção. Queria saber cantar pra expurgar esse tanto, essa coisa imensa que não cessa.
Os dias me cortam como o frio, quando nem o frio existe. 
Mas habita e corta e sangra. Frio.
São as minhas misérias, só minhas. Essas que me distanciam de qualquer outra coisa, essas que afastam de qualquer calor.
Queria mesmo cantar.
Sair desse quarto.
Sumir com esses tapetes daqui.

Sobre esse tudo que sou.

Fico perambulando entre essas mulheres que construí.
Mulheres tantas que me ocupam em formas ,tamanhos e trejeitos tão distintos entre si, 
tão idênticos em vontade.
Sou um misto de exoterismo e racionalidade. Uma construção desconstruída de todo desejo e desprezo que me invade por todos os lados, durante todo o tempo, tão despretensiosamente cheio de pretensões
Sou o inverso e o reverso de todas as coisas. 
Sou uma história mal contada , dentro de tantos finais e recomeços e infortúnios feitos de tanta beleza e tanta miséria.
Sou você, sou o pai, sou o sol.
Fico perambulando entre tanto , entre tudo que ocupa esse vazio imenso.
Estamos em guerra. Lutas diárias entre minutos e almas,
Entre eu e eu mesma.
e que assim permaneça, até que me esgote.